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aos olhos do Criador,
nada sou.
aos olhos de meu semelhante,
mais não sou.
são os filhos que nos fazem eternidade.
mas a existência é efémera.
o coração chora.
porém, nunca esquecerá.
*
Hoje fui acordado com a notícia duma morte. Um Pai comunica a morte do seu Filho.
Dediquei um dos meus livros à minha filha Ana, que considero ter sido o meu primeiro passo na eternidade. Já dei dois. É o meu maior receio: perder um filho.
Não consigo imaginar o que o meu amigo e colega Abílio estará a sentir. Espero apenas que o Criador lhe conceda serenidade.
O poema infra não é novo, mas foi adaptado para a memória dum filho que partiu.
Para o Abílio!
Recordação
Quantas vezes nisto falamos?
Quantas vezes o expressamos?
Quantas vezes o receamos?
Se tivesse que morrer por ti,
de bom grado o faria.
Porque em ti e por ti,
a minha luz jamais se extinguiria.
Mas assim alguém não quis!
E foste tu, não eu, quem partiu.
E eu? Eu sou aquele que vive no alento
do reencontro,
alimentado pela tua recordação.
Sou aquele que no silêncio fala contigo,
aquele que receia que todas as palavras que diz,
que todas as palavras que contigo divido,
não cheguem para expressar os sentimentos que me inspiras.
Sou aquele que tenta,
em vão,
retribuir tal avalanche de sensações.
Sou aquele que ainda te deseja.
Aquele que deseja que os seus medos se transformem
em ondas que te aconcheguem,
refrescando-te nas noites quentes do Verão,
protegendo-te nos dias de tempestade do Inverno.
Sou aquele que não se satisfaz com tais desejos.
Porque nem a possibilidade de essas ondas te presentearem
com um constante renovar de quadros,
pintados por estrelas na tela da noite, seria suficiente.
Sou aquele que canta o desencanto
porque nada me encanta sem o teu encanto,
sem o teu ser,
sem o teu viver.
Sou aquele que não é jardineiro
mas que cuida do teu canteiro,
de todos os teus canteiros.
Porque tu és o meu jardim,
és todos os meus jardins.
Sou aquele que suplica ao sol
por mais um momento de luar,
para nele rever o teu rosto,
para nele te recordar.
Sou aquele que aguarda o aguardar
porque aguardar reencontrar-te é o que me resta fazer.
Aguardar, esperando.
Aguardar, olhando o mar
e desejando o além abraçar.
Sou aquele que ainda é teu.
Aquele que já era teu quando não eras meu!
Aquele que foi teu quando foste meu!
Aquele que continua teu, porque ainda és meu!
Sou aquele que não desiste.
Aquele que aqui, a custo, persiste.
Porque dói a tua lembrança.
Por nela depositar a esperança.
Sou aquele que tem de continuar
sem pensar em morrer.
Aquele que aqui continua a viver
para a tua recordação honrar.
E também sou aquele que para ti voltará.
Aquele que contigo ficará,
por todo o espaço do tempo
e por todo o tempo do espaço.
in 30 Mensagens de Amor e Uma Recordação
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